O presente já terá passado e nunca mais poderemos chamá-lo de volta*

1 NIETZSCHE, F. W., 1844-1900. Aurora: reflexões sobre os preconceitos morais. Tradução P. C. de Souza. São Paulo: Companhia das Letras. 2004. 330p.

2 SCHOPENHAUER, A., 1788. Aforismos para a sabedoria de vida. Tradução Jair Barboza. São Paulo: Martins Fontes, 2006. 276p.

3 MONTAIGNE, M. de, 1533-1592. Os ensaios. Tradução R. F d’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. 591p.

O que é querer? – Rimos daquele que saiu de seu aposento no minuto em que o Sol deixa o dele, e diz: “Eu quero que o Sol se ponha ; e daquele que não pode parar uma roda e diz: “Eu quero que ela rode”; e daquele que no ringue de luta é derrubado, e diz: “Estou aqui deitado, mas eu quero estar aqui deitado!” No entanto, apesar de toda risada, agimos de maneira diferente de algum desses três, quando usamos a expressão “eu quero“? (1)

Os “caminhos”. – Os pretensos “atalhos” sempre puseram a humanidade em perigo; com a boa-nova de que um tal caminho mais curto foi achado, ela deixa seu caminho – e perde o caminho. (1)

Um escritor antigo disse com bastante pertinência que há três poderes no mundo: a inteligência, a força e a sorte. Acredito que a última seja a que pode mais. Pois nosso caminho de vida é comparável ao curso de um navio. O destino, a sorte favorável ou adversa, desempenha o papel do vento que nos impele rapidamente para adiante, ou para trás, sendo os nossos esforços e os nossos empenhos de muito pouca serventia. Estes desempenham o papel dos remos: quando, depois de muitas horas de trabalho, fizeram-nos avançar no percurso, uma súbita rajada de vento faz-nos regredir o mesmo tanto. Ao contrário, se este último é favorável, avançamos de tal modo que nem precisamos dos remos. Essa potência da sorte é expressa de maneira admirável por um provérbio espanhol: Da ventura a tu hijo, y echalo en el mar [Dá ventura ao teu filho e atira-o ao mar] (2)

Prudente é quem não é enganado pela estabilidade aparente das coisas e, ainda antevê a direção que a mudança tomará. Por outro lado, o que via de regra faz os homens tomarem o estado provisório das coisas ou a direção do seu curso como permanente é o fato de terem os efeitos diante dos olhos, sem todavia entender as suas causas. Mas são estas que trazem o germe das mudanças futuras, enquanto os efeitos, únicos existentes para os olhos, nada contêm de parecido. (2)

A melhor coisa do mundo é saber ser de si mesmo. É tempo de desligarmo-nos da sociedade, posto que nada podemos lhe conceder. E quem não pode emprestar, que se livre de pedir emprestado. Nossas forças estão nos faltando: retiremo-las e estreitemo-las dentro de nós. (3)

Que a infância olhe diante de si, e a velhice, para trás: não era o que significava a dupla face de Juno? (3)

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  • Lucrécio, III, 915.

O presente já terá passado e nunca mais poderemos chamá-lo de volta*